Dados do instrumento CRISP no Telescópio Solar Sueco (SST) em La Palma mostram a presença de fluxos descendentes na penumbra de uma mancha solar. Estes fluxos eram a peça do puzzle que faltava para decidir entre duas classes de modelos que tentam explicar a penumbra.
Os resultados estão publicados na revista Science Express. . Os autores são: Göran B. Scharmer, Vasco M.J. Henriques, Dan Kiselman, (todos do Instituto para Física Solar da Academia Real de Ciências Sueca e Departamento de Astronomia da Universidade de Estocolmo) , e Jaime de la Cruz Rodríguez (Universidade de Oslo).
Uma mancha solar é uma área escura no Sol, maior do que a Terra, associada a um forte campo magnético. A parte escura central da mancha solar é a umbra. Esta é rodeada pela penumbra, que tem uma estrutura filamentar semelhante à íris de um olho.
As manchas solares são mais escuras do que os seus arredores porque o campo magnético inibe os movimentos convectivos sob a superfície que transportam calor. Porém não são completamente escuras e frias. Pode parecer estranho mas um dos mistérios das manchas solares é porque é que são tão brilhantes! Afinal, a penumbra brilha com cerca de 75% da radiação normal da superfície solar.
Que processos físicos moldam e aquecem a penumbra? É convecção do mesmo tipo que opera na superfície usual ou "calma" do Sol? Ai a convecção origina um padrão conhecido como "granulação" onde gás quente e brilhante ascende e gás frio e escuro mergulha. Se processos similares são válidos para a penumbra então deveria haver um padrão sistemático de movimentos revolventes no gás. No entanto, tal padrão nunca foi observado — até agora.
Os fluxos descendentes identificados no presente estudo estão estatisticamente associados a regiões escuras, ao contrário dos fluxos ascendentes adjacentes associados com regiões brilhantes. Esta é uma forte e simples indicação de convecção. Esta simples observação juntamente com uma análise estatística que permite desacoplar movimentos verticais de movimentos horizontais leva à uma das conclusões principais do artigo: a de que a penumbra é aquecida e, em larga medida, estruturada, por um fluxo convectivo de baixo. Este resultado, que é suportado por simulações recentes, deve por um ponto final num longo debate científico.
Também observado é o facto de os fluxos convectivos descendentes e ascendentes estarem associados com fortes (vários kilometros por segundo) fluxos radiais e horizontais do interior para o exterior da mancha. Isto significa que o efeito de Evershed — um fluxo sistemático do interior para o exterior da mancha solar de vários km/s na penumbra observado há 102 anos — pode agora ser explicado como a componente horizontal destes fluxos convectivos. O efeito de Evershed foi descoberto em 1909 por John Evershed no Observatório de Kodaikanal na Índia e tem permanecido assunto de intensa investigação e debate entre físicos solares desde então.
Na verdade, a maioria dos cientistas não esperava este resultado. Os modelos dominantes para a penumbra tentavam relacionar directamente as estruturas filamentares observadas com longos tubos magnéticos. Nesses modelos o efeito de Evershed era um fluxo radial de gás ao longo desses tubos.
Porém uma classe de modelos e simulações recentes, que encontraram muita resistência devido à ausência de observações como as que este artigo disponibilizou, explicam as estruturas enlongadas da penumbra como células convectivas que "empurram" e concentram o fluxo magnético emergente da mancha solar em pistas elongadas (um "empurrar" que pode, também, explicar a própria origem da umbra).
Assim, a estrutura filamentar da penumbra é constituída por, essencialmente, células convectivas e zonas de campo magnético emergentes ambos "espremidos" um pelo outro. Além disso, como existe uma assimetria geométrica da umbra para a granulação (e em vários aspectos físicos como o facto de o campo magnético ser mais vertical na umbra e mais horizontal acima da penumbra) o fervilhar destas células convectivas tem também uma forte componente radial orientada para o exterior criando-se, assim, o misterioso efeito de Evershed.
A detecção destes fluxos convectivos não foi fácil. Requereu o seguinte:
Multimédia associada:
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Mancha solar em contexto | Granulação em redor | Umbra | Penumbra | Mapa de velocidade da penumbra |
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Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: G.B. Scharmer, V.M.J. Henriques, D. Kiselman, J. de la Cruz Rodríguez
Uma imagem da mancha solar e os seus arredores tirada em luz violeta onde a resolução espacial é a mais alta. A imagem (escala de cinzento no original) for colorida por razões estéticas. A mancha solar consiste de uma zona central chamada umbra rodeada pela filamentar penumbra. Toda a mancha é então rodeada pela granulação. O campo de visão corresponde a 47000 km no Sol. Esta imagem com uma resolução de 0.1 segundos de arco, reconstruída com imagens do telescópio Solar Sueco, representa o limite do que é actualmente possível em termos de resolução espacial.
Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: V.M.J. Henriques
Filme da mancha solar adquirida em luz violeta. Colorida por motivos estéticos. A sequência corresponde a 53 minutos de tempo real. Os filamentos da penumbra aparentam mover-se para o interior mas o fluxo de gás é, na verdade, direccionado sobretudo para o exterior, para fora da umbra escura. De momento via YouTube.
Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: V.M.J. Henriques
Uma imagem da mancha solar com a Terra mostrada à escala. A imagem solar foi adquirida em luz violeta e colorida por motivos estéticos.
Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: V.M.J. Henriques, Dan Kiselman, e NASA (imagem da Terra)
Velocidades na mancha solar e arredores como medidas utilizando o efeito de Doppler. Azul implica que o gás se está a mover em direcção a nós - isto corresponde a um movimento para cima na superfície solar. Vermelho implica que o gás se está a afastar de nós - isto corresponde a uma movimento para baixo na superfície solar. O padrão semelhante a uma rede rodeando a mancha é a granulação solar. O campo de visão corresponde a 24000 km no Sol.
Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: G.B. Scharmer, V.M.J. Henriques, D. Kiselman, J. de la Cruz Rodríguez
Imagem da mancha solar com sobreposição do mapa de velocidades que alternadamente mostra desvios para o vermelho e para o azul. Azul implica que o gás se está a mover em direcção a nós - isto corresponde a um movimento para cima na superfície solar. Vermelho implica que o gás se está a afastar de nós - isto corresponde a uma movimento para baixo na superfície solar. A assimetria nas imagens a vermelho e azul é devida ao facto de a mancha solar ser observada a um ângulo. O fluxo de Evershed, sendo direccionado para o exterior, mostra um desvio para o vermelho do lado da mancha solar que está a apontar para longe do observador e um desvio para o azul do outro lado: o lado virado para o centro do Sol que está para a esquerda da imagem. Que esses desvios para o vermelho sejam visíveis, também, do lado do centro do centro solar é um testamento visual do resultado deste trabalho cujas principais conclusões, porém, assentam sobretudo numa análise estatística sólida.
Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: G.B. Scharmer, V.M.J. Henriques, D. Kiselman, J. de la Cruz Rodríguez
O telescópio solar sueco (Swedish 1-m Solar Telescope SST) em La Palma. O telescópio está a apontar para o Sol nascente.
Credit: D. Kiselman