Por isso brilham as manchas solares!

Fluxos convectivos descendentes observados na penumbra de uma mancha solar.

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Mancha solar em alta resolução. Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: V.M.J. Henriques

O efeito de Evershed, descoberto em 1909, o brilho da penumbra das manchas solares e a sua curiosa estrutura filamentar têm permanecido um mistério — até agora!

Dados do instrumento CRISP no Telescópio Solar Sueco (SST) em La Palma mostram a presença de fluxos descendentes na penumbra de uma mancha solar. Estes fluxos eram a peça do puzzle que faltava para decidir entre duas classes de modelos que tentam explicar a penumbra.

Os resultados estão publicados na revista Science Express. . Os autores são: Göran B. Scharmer, Vasco M.J. Henriques, Dan Kiselman, (todos do Instituto para Física Solar da Academia Real de Ciências Sueca e Departamento de Astronomia da Universidade de Estocolmo) , e Jaime de la Cruz Rodríguez (Universidade de Oslo).

Uma mancha solar é uma área escura no Sol, maior do que a Terra, associada a um forte campo magnético. A parte escura central da mancha solar é a umbra. Esta é rodeada pela penumbra, que tem uma estrutura filamentar semelhante à íris de um olho.

As manchas solares são mais escuras do que os seus arredores porque o campo magnético inibe os movimentos convectivos sob a superfície que transportam calor. Porém não são completamente escuras e frias. Pode parecer estranho mas um dos mistérios das manchas solares é porque é que são tão brilhantes! Afinal, a penumbra brilha com cerca de 75% da radiação normal da superfície solar.

Que processos físicos moldam e aquecem a penumbra? É convecção do mesmo tipo que opera na superfície usual ou "calma" do Sol? Ai a convecção origina um padrão conhecido como "granulação" onde gás quente e brilhante ascende e gás frio e escuro mergulha. Se processos similares são válidos para a penumbra então deveria haver um padrão sistemático de movimentos revolventes no gás. No entanto, tal padrão nunca foi observado — até agora.

Os fluxos descendentes identificados no presente estudo estão estatisticamente associados a regiões escuras, ao contrário dos fluxos ascendentes adjacentes associados com regiões brilhantes. Esta é uma forte e simples indicação de convecção. Esta simples observação juntamente com uma análise estatística que permite desacoplar movimentos verticais de movimentos horizontais leva à uma das conclusões principais do artigo: a de que a penumbra é aquecida e, em larga medida, estruturada, por um fluxo convectivo de baixo. Este resultado, que é suportado por simulações recentes, deve por um ponto final num longo debate científico.
Imagem da mancha solar com sobreposição dos fluxos descendentes detectados Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: G.B. Scharmer, V.M.J. Henriques, D. Kiselman, J. de la Cruz Rodríguez

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Também observado é o facto de os fluxos convectivos descendentes e ascendentes estarem associados com fortes (vários kilometros por segundo) fluxos radiais e horizontais do interior para o exterior da mancha. Isto significa que o efeito de Evershed — um fluxo sistemático do interior para o exterior da mancha solar de vários km/s na penumbra observado há 102 anos — pode agora ser explicado como a componente horizontal destes fluxos convectivos. O efeito de Evershed foi descoberto em 1909 por John Evershed no Observatório de Kodaikanal na Índia e tem permanecido assunto de intensa investigação e debate entre físicos solares desde então.

Na verdade, a maioria dos cientistas não esperava este resultado. Os modelos dominantes para a penumbra tentavam relacionar directamente as estruturas filamentares observadas com longos tubos magnéticos. Nesses modelos o efeito de Evershed era um fluxo radial de gás ao longo desses tubos.

Porém uma classe de modelos e simulações recentes, que encontraram muita resistência devido à ausência de observações como as que este artigo disponibilizou, explicam as estruturas enlongadas da penumbra como células convectivas que "empurram" e concentram o fluxo magnético emergente da mancha solar em pistas elongadas (um "empurrar" que pode, também, explicar a própria origem da umbra).

Assim, a estrutura filamentar da penumbra é constituída por, essencialmente, células convectivas e zonas de campo magnético emergentes ambos "espremidos" um pelo outro. Além disso, como existe uma assimetria geométrica da umbra para a granulação (e em vários aspectos físicos como o facto de o campo magnético ser mais vertical na umbra e mais horizontal acima da penumbra) o fervilhar destas células convectivas tem também uma forte componente radial orientada para o exterior criando-se, assim, o misterioso efeito de Evershed.
 

A detecção destes fluxos convectivos não foi fácil. Requereu o seguinte:

  • Alta resolução espacial: Providenciada pelo SST, a visibilidade atmosférica de La Palma, óptica adaptativa, a técnica de reconstrução de imagem MOMFBD onde a informação de várias centenas de imagens são combinadas numa única.

  • Alta resolução espectral e fidelidade: Providenciada pelo instrumento CRISP .

  • O uso de um diagnóstico sensível em profundidade: A linha espectral do carbono neutro no comprimento de onda 5380 Å requere gás quente e, por isso, é formada muito fundo na fotosfera solar.

  • Subtracção de luz difusa: luz difusa pela atmosfera e pela instrumentação degradam as imagens de uma forma que é difícil de medir. Aqui, a luz difusa foi modelada comparando a granulação observada com simulações teóricas. Isto é possível por a granulação estar bem compreendida nestas escalas.

  • Calibração cuidadosa dos comprimentos de onda: é importante encontrar a origem da escala de velocidade quando se utiliza o efeito de Doppler. Mais uma vez, simulações teóricas de granulação foram usadas.

    Multimédia associada:

    As imagens podem ser reproduzidas se a fonte for mencionada como expresso na linha de crédito.

    Clique nas imagens para versões de alta resolução.


    Mancha solar em contexto Granulação em redor Umbra Penumbra Mapa de velocidade da penumbra
    As imagens ilustram as componentes principais de uma mancha solar junto com o produto principal deste trabalho: um mapa de velocidades na penumbra.

    Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: G.B. Scharmer, V.M.J. Henriques, D. Kiselman, J. de la Cruz Rodríguez


    Uma imagem da mancha solar e os seus arredores tirada em luz violeta onde a resolução espacial é a mais alta. A imagem (escala de cinzento no original) for colorida por razões estéticas. A mancha solar consiste de uma zona central chamada umbra rodeada pela filamentar penumbra. Toda a mancha é então rodeada pela granulação. O campo de visão corresponde a 47000 km no Sol. Esta imagem com uma resolução de 0.1 segundos de arco, reconstruída com imagens do telescópio Solar Sueco, representa o limite do que é actualmente possível em termos de resolução espacial.

    Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: V.M.J. Henriques


    Filme da mancha solar adquirida em luz violeta. Colorida por motivos estéticos. A sequência corresponde a 53 minutos de tempo real. Os filamentos da penumbra aparentam mover-se para o interior mas o fluxo de gás é, na verdade, direccionado sobretudo para o exterior, para fora da umbra escura. De momento via YouTube.

    Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: V.M.J. Henriques


    Uma imagem da mancha solar com a Terra mostrada à escala. A imagem solar foi adquirida em luz violeta e colorida por motivos estéticos.

    Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: V.M.J. Henriques, Dan Kiselman, e NASA (imagem da Terra)


    Velocidades na mancha solar e arredores como medidas utilizando o efeito de Doppler. Azul implica que o gás se está a mover em direcção a nós - isto corresponde a um movimento para cima na superfície solar. Vermelho implica que o gás se está a afastar de nós - isto corresponde a uma movimento para baixo na superfície solar. O padrão semelhante a uma rede rodeando a mancha é a granulação solar. O campo de visão corresponde a 24000 km no Sol.

    Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: G.B. Scharmer, V.M.J. Henriques, D. Kiselman, J. de la Cruz Rodríguez


    Imagem da mancha solar com sobreposição do mapa de velocidades que alternadamente mostra desvios para o vermelho e para o azul. Azul implica que o gás se está a mover em direcção a nós - isto corresponde a um movimento para cima na superfície solar. Vermelho implica que o gás se está a afastar de nós - isto corresponde a uma movimento para baixo na superfície solar. A assimetria nas imagens a vermelho e azul é devida ao facto de a mancha solar ser observada a um ângulo. O fluxo de Evershed, sendo direccionado para o exterior, mostra um desvio para o vermelho do lado da mancha solar que está a apontar para longe do observador e um desvio para o azul do outro lado: o lado virado para o centro do Sol que está para a esquerda da imagem. Que esses desvios para o vermelho sejam visíveis, também, do lado do centro do centro solar é um testamento visual do resultado deste trabalho cujas principais conclusões, porém, assentam sobretudo numa análise estatística sólida.

    Crédito: Academia Real de Ciências Sueca: G.B. Scharmer, V.M.J. Henriques, D. Kiselman, J. de la Cruz Rodríguez


    O telescópio solar sueco (Swedish 1-m Solar Telescope SST) em La Palma. O telescópio está a apontar para o Sol nascente.

    Credit: D. Kiselman


    Time-stamp: <2011-06-03 17:50:00 Vasco>